Campo Grande, MS, 06 de dezembro de 2024.
Os 515 participantes do Agroecol 2024, sendo 320 mulheres, 188 homens e 7 outros, representando 178 instituições e entidades/organizações, destacam sua motivação em compartilhar conhecimentos e experiências, debater e, sobretudo, sua disposição para o diálogo entre as ciências e as organizações da sociedade, governos (federal, estaduais e municipais) a colaboração para construir caminhos agroecológicos que permitam cultivar e construir um mundo onde todos possam usufruir do bem viver.
Assim, elaboraram e validaram propostas durante o evento, as quais são apresentadas sucintamente a seguir:
Fortalecimento da Agroecologia na agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana
Reconhecimento e compreensão do potencial transformador da Agroecologia para a mudança de paradigma de desenvolvimento capaz de construir uma agricultura biodiversa, de base familiar camponesa e resiliente às mudanças climáticas.
Compreensão e compromisso da Agroecologia em transformar essa realidade de iniquidade do campo, promovendo o desenvolvimento rural verdadeiramente sustentável, muito além das corriqueiras frases modais, e a construção de um mundo mais justo, solidário e ambientalmente sustentável.
Fortalecimento das estratégias de educação em Agroecologia em todos os níveis, bem como a produção científica e tecnológica e os respectivos meios de disseminação, para fortalecer o diálogo com o conjunto dos conhecimentos necessários à construção do conhecimento agroecológico e a formação de uma massa crítica capaz de enfrentar os desafios do futuro.
Fortalecimento das estratégias agroecológicas para a construção de uma matriz energética sustentável, ancorada em energias eólicas, hidroelétricas de pequeno porte, solar e biomassa, alternativa à atual matriz que tem como base o uso do petróleo e à expansão dos agrocombustíveis que substituem a produção de alimentos, comprometem biomas, populações locais e suas culturas.
Adoção do enfoque científico da Agroecologia, cuja base epistemológica pressupõe a junção e o intercâmbio dos saberes técnico-científico e populares.
Reconhecimento da importância da agricultura familiar camponesa e dos saberes dos povos indígenas e tradicionais para assegurar o fortalecimento do tecido social e da identidade cultural dos povos latino-americanos, incluindo o acesso à terra, sementes e água, bem como o direito à segurança e soberania alimentar.
Reconhecimento dos saberes e experiências das mulheres nas suas práticas ligadas à reprodução da vida: segurança e soberania alimentar, saúde, manutenção e conservação da agrobiodiversidade. Que suas reivindicações e demandas sejam valorizadas por extensionistas, pesquisadores, gestores e lideranças.
Contemplar as relações de gênero, evidenciando a necessidade de valorizar as contribuições das mulheres e as questões que dificultam a sua participação como sujeitos plenos de direitos, entre elas, a violência cotidiana enfrentada pelas agricultoras.
Manutenção de centros de origem das espécies cultivadas livres de organismos transgênicos e que seja proibido o patenteamento da biodiversidade e outras regulamentações que impedem o livre intercâmbio dos recursos genéticos, o que é fundamental para a soberania alimentar da humanidade.
Fortalecimento da produção diversificada, circuitos curtos de comercialização e do desenvolvimento local sustentável
Implementação de um amplo Programa para o Desenvolvimento da Agroecologia no Brasil voltado à agricultura familiar, povos tradicionais e comunidades indígenas, com atuação integrada e sinérgica de vários ministérios. Que os Estados e os Municípios elaborem e implementem seus Programas, integrados ao Programa Nacional, contemplando as especificidades das realidades locais e dos povos envolvidos.
Estímulos à criação e fortalecimento de grupos informais, associações e cooperativas de agricultores agroecológicos e orgânicos para auxiliar na organização de compras conjuntas, da produção, assistência técnica e comercialização.
Estímulos à agroindustrialização cooperativa para beneficiar a produção diversificada, principalmente envolvendo frutíferas e hortaliças, agregando valor a essas cadeias produtivas.
Apoio, principalmente logístico, à criação e manutenção de feiras de agricultores nos municípios, visando o fortalecimento da comercialização da produção local diversificada e em bases agroecológicas, visando a eliminação de intermediários.
Estímulos à formação e funcionamento de cooperativas de consumidores, para criar laços entre estes e agricultores locais (rurais e urbanos), fortalecendo a demanda de produção diversificada e em bases agroecológicas e sua comercialização.
Fortalecimento de mercados institucionais, priorizando a agricultura familiar, como o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA e Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, além da criação e implementação de outros programas, para darem suporte à comercialização da produção diversificada e em bases agroecológicas.
Estímulo por meio de redução e até isenção de impostos a estabelecimentos comerciais locais que adquirirem produtos oriundos de sistemas biodiversos, produzidos em bases agroecológicas pela agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana no município e municípios vizinhos.
Apoio a grupos de mulheres e jovens rurais e urbanos para a adoção de sistemas biodiversos e em bases agroecológicas, incentivando-os a processamentos mínimos da produção e venda em canais curtos de comercialização, preparando-os para atuarem como multiplicadores.
Implementação de programas de apoio à agroindustrialização de produtos da agro sociobiodiversidade produzidos em bases agroecológicas, estimulando processamentos mínimos, fomentando agroindústrias familiares e sistemas cooperativos interfamiliares nas comunidades rurais e periurbanas.
Fomento à produção e processamento de frutas nativas em cada bioma, por meio de sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Implementação de um programa de desenvolvimento da agricultura urbana utilizando-se sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Implementação de programas de paisagismo produtivo em praças, prédios públicos, canteiros centrais e em Áreas de Preservação Permanentes (APPs) urbanas nos municípios, com foco em espécies frutíferas produtoras de alimentos e em bases agroecológicas.
Processos de formação em sistemas biodiversos em bases agroecológicas
Arranjo interinstitucional, coordenado pelo governo federal, envolvendo universidades federais, institutos federais, unidades da Embrapa, universidades estaduais, instituições estaduais de pesquisa e de extensão rural, organizações da sociedade civil, entre outros, para formação de profissionais e agricultores em sistemas biodiversos e em bases agroecológicas. Identificar, cadastrar e formar equipes para implementar duas frentes de atuação: 1) Cursos de graduação e pós-graduação; 2) Formação continuada de agricultores.
Criação de cursos interinstitucionais de pós-graduação em nível de especialização, mestrado e doutorado em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Inserção de disciplinas de sistemas biodiversos e em bases agroecológicas nas grades curriculares dos cursos de Engenharia Agronômica, Engenharia Florestal, Agroecologia, Gestão Ambiental, entre outros afins, com intuito de despertar estudantes para se aprofundarem em formações específicas por meio de pós-graduações.
Gestões do governo federal e parcerias com os governos estaduais para a criação de cursos técnicos em sistemas agroflorestais biodiversos em bases agroecológicas.
Fortalecimento da pesquisa pública e transferência de tecnologias
Ampliação das equipes de pesquisa e transferência de tecnologias que atuam junto à agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Ampliação do aporte de recursos para pesquisas e transferência de tecnologias, priorizando metodologias participativas, visando beneficiar a agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Revitalização da agenda de pesquisa e transferência de tecnologias da Embrapa, destacando como prioridade a agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Fortalecimento da Embrapa, com ampliação do quadro funcional, recursos para custeios e investimentos nas atividades de pesquisa e transferência de tecnologias para a agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Ampliação das equipes e de aporte de recursos financeiros nas instituições estaduais de pesquisa e extensão rural para atuação junto à agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Ampliação das equipes e de aporte de recursos financeiros nas universidades e institutos federais, bem como nas universidades estaduais, para atuação junto à agricultura familiar, povos indígenas, comunidades tradicionais, agricultura urbana e periurbana, com foco em sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Assistência técnica qualificada e em quantidade adequada às necessidades dos agricultores
Destinação de “equipes técnicas multidisciplinares e em quantidades adequadas” de profissionais em função das especificidades dos sistemas biodiversos em bases agroecológicas e suas cadeias produtivas, valorizando e respeitando as singularidades territoriais, promovendo a cidadania e o desenvolvimento rural sustentável.
Formatação e implementação de processos de capacitação continuada de técnicos e agricultores em sistemas biodiversos em bases agroecológicas, por meio de cursos (curta, média e longa duração), oficinas, visitas a experiências exitosas e intercâmbios com trocas de saberes e experiências com os atores responsáveis, entre outras metodologias, para se habilitarem a trabalharem com esses agroecossistemas e suas cadeias produtivas.
Utilização de sistemas biodiversos em bases agroecológicas implantados por agricultores e/ou suas organizações como “Unidades-Referência” para atividades coletivas de Assistência Técnica e Extensão Rural, facilitando a troca de experiências entre agricultores e técnicos e construção de conhecimentos.
Adoção de políticas de extensão rural com diretrizes e orientação técnica para auxiliar os agricultores a promoverem a transição de monocultivos ou sistemas pouco diversificados para sistemas biodiversos em bases agroecológicas.
Crédito condizente com sistemas biodiversos em bases agroecológicas, desburocratizado e flexível
Que os recursos qualificados como “Fomento” para novos assentamentos rurais formalizados em processos de reforma agrária, visam à “implementação de projetos produtivos de promoção da segurança alimentar e nutricional e de estímulo à geração de trabalho e renda” (Decreto nº 11.586/2023), sejam destinados exclusivamente à implantação de sistemas biodiversos em bases agroecológicas, preferencialmente sistemas agroflorestais, no entorno ou próximos às novas residências.
Disponibilização de linhas especiais de créditos desburocratizados e flexíveis para sistemas biodiversos em bases agroecológicas, que contemplem as particularidades desses sistemas (incluindo-se aquisição de maquinários, ferramentas e equipamentos apropriados, não se restringindo a kits pré-estabelecidos).
Que as linhas de créditos tenham carência condizente para pagamento, uma vez que os sistemas biodiversos em bases agroecológicas, principalmente os sistemas agroflorestais são perenes.
Que as linhas de créditos disponibilizadas para sistemas biodiversos em bases agroecológicas não tenham as mesmas concepções dispensadas a sistemas homogêneos (monoculturas ou monoatividades).
Que as linhas de créditos para sistemas biodiversos em bases agroecológicas não sejam condicionadas a pacotes tecnológicos, e que sejam desburocratizadas, não fazendo as mesmas exigências cobradas de produtores patronais ou empresariais.
Reconhecimento e pagamentos por serviços ambientais e socioeconômicos
Viabilização de formas de pagamento em função dos múltiplos benefícios gerados pelos sistemas biodiversos em bases agroecológicas à sociedade e não deve ser nos moldes que é tratada a estocagem de carbono, como se fosse o único serviço ambiental produzido, pois é excludente e desvaloriza a multiplicidade dos serviços que esses agroecossistemas provêm.
O enfoque holístico no reconhecimento dos serviços prestados por sistemas biodiversos em bases agroecológicas deve contemplar e valorizar a sua essência e estimular os agricultores a continuarem contribuindo com o país por meio de sistemas resilientes às adversidades decorrentes das mudanças climáticas.
Implementação de política de “compensações especiais” aos agricultores por serviços ambientais e socioeconômicos providos por sistemas biodiversos em bases agroecológicas. Esse “PSA especial” pode ser viabilizado por meio da somatória de benefícios, como: incentivos fiscais, créditos especiais, priorização em mercados institucionais, atendimento prioritário em bancos públicos, desburocratização em processos de financiamentos, entre outras compensações.
Máquinas e equipamentos para otimizar os trabalhos em sistemas biodiversos em bases agroecológicas
Implementação de políticas de apoio à fabricação de máquinas e equipamentos de pequeno porte, condizentes com a realidade da agricultura familiar, bem como às especificidades dos sistemas biodiversos em bases agroecológicas, com ênfase especial aos sistemas agroflorestais biodiversos.
Fomentos aos agricultores para adquirirem máquinas e equipamentos adequados para as diferentes atividades a serem realizadas nos sistemas biodiversos em bases agroecológicas, com intuito de reduzir a penosidade do trabalho, aumentar a eficiência das operações e possibilitar a condução de maiores áreas com esses agroecossistemas, otimizando a utilização da mão de obra.
Fortalecimento do consumo de produtos oriundos de sistemas biodiversos em bases agroecológicas
Realização de campanhas de conscientização dos consumidores sobre os benefícios ambientais e sociais gerados pelos sistemas biodiversos em bases agroecológicas, bem como inerente à qualidade dos produtos oriundos desses agroecossistemas.
Criação de um “Selo” para utilização em processos de comercialização da produção oriunda de sistemas biodiversos em bases agroecológicas, com atenção especial aos sistemas agroflorestais biodiversos, sem a burocracia adotada na certificação orgânica, com intuito de distinguir de sistemas simplificados, visando reconhecimento dos consumidores.
Enviar sugestões para o Milton Padovan ou para o e-mail agroecol.cpan@ufms.br